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Adnan Demachki – O caminho do Brasil rumo à COP30 depende do Código Florestal

Só 1,4% dos CAR estão com análise de regularidade ambiental concluída.

A um ano e meio de sediar a principal Conferência do Clima das Nações Unidas dos últimos anos, o Brasil ainda não implementou a sua principal lei ambiental, considerada uma das mais avançadas do mundo.

A COP30, a primeira a ser realizada num país que, além de ser uma potência agrícola e florestal, é detentor de uma megabiodiversidade e de uma matriz energética de baixo carbono, acontecerá em Belém, em novembro de 2025. E se o mundo tinha pressa em ver o Brasil voltar aos debates globais sobre a pauta ambiental, isso agora se converteu em grandes expectativas por propostas e resultados de mitigação da emergência climática. E é por isso que não podemos chegar lá sem instituir, na prática, o Código Florestal brasileiro, criado pela Lei 12.651, de 25 de maio de 2012.

O documento estabelece normas para a proteção da vegetação nativa em áreas rurais. Alvo de protestos por parte de movimentos de defesa do meio ambiente ao longo do seu processo de elaboração por ser considerado insuficiente, hoje ele é tido como um importante mecanismo que pode reverter os índices de devastação nos principais biomas brasileiros, como a Amazônia. De lá para cá, mais de 13 milhões de hectares foram desmatados e 12 milhões deixaram de ser restaurados e, ainda assim, as medidas de proteção e preservação previstas no Código Florestal não saíram do papel.

Além de estabelecer as áreas de proteção em imóveis rurais e incluir as Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de Uso Restrito, a lei dispõe sobre mecanismos de controle da exploração florestal para extração de matéria-prima e produção de produtos e prevenção de incêndios.

Um de seus principais instrumentos é o Cadastro Ambiental Rural (CAR), que permite que o poder público possa ter informações específicas sobre a localização, a área dos imóveis e quais porções deles devem ser destinadas à proteção florestal, principalmente nas áreas de Reserva Legal e Preservação Permanente (APP). No entanto, dados do Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática atestam que apenas 1,4% dos CAR, que São autodeclaratórios, estão com a análise de regularidade ambiental concluída pelos órgãos ambientais, enquanto 27,87% passaram por algum tipo de análise inicial. É como se a Receita Federal tivesse processado menos de 1/3 das declarações de Imposto de Renda nos últimos 10 anos e concluído menos de 2% dos lotes de restituição.

Sem a validação do CAR, na prática, o processo de proteção e recuperação dos passivos ambientais não ganha velocidade e consistência, adiando o “acerto de contas” ambiental. Por outro lado, o imóvel rural que possui excedente florestal — ou seja, área de floresta superior ao mínimo legal exigido, que poderia ser comparado à restituição fiscal – não encontra demanda firme para receber o merecido pagamento pelo serviço ambiental prestado.

Sem mencionar os mecanismos de incentivos econômicos e outros instrumentos positivos que dependem de regulamentação e que ainda não saíram do papel, tais como: pagamento ou incentivo a serviços ambientais, crédito e seguro agrícola em melhores condições que as praticadas no mercado, incentivo fiscal e isenção de impostos, tanto para os produtores que preservam ou recuperam as matas, quanto para as empresas que comercializam com estes produtores. Tudo isso está previsto no artigo 41 do Código Florestal e falta ganhar vida nos programas governamentais.

Em todo o Brasil, o déficit de Reserva Legal chega a 16,3 milhões de hectares, o equivalente aos territórios da Grécia e Bélgica somados, de acordo com o Termômetro do Código Florestal. A maior parte desse passivo (57%) concentra-se na Amazônia. No bioma, onde a cota de Reserva Legal é de 80%, o déficit é de 9,4 milhões de hectares, o equivalente ao território do Estado de Santa Catarina.

O Cerrado, onde apenas 20% da vegetação nativa da propriedade rural precisa ser preserva-da, concentra 3,9 milhões de hectares de déficit, seguido pela Mata Atlântica, com 2,5 milhões de hectares de passivo.

No total, temos expressivos 7,2 milhões de cadastros, que somam 671 milhões de hectares inscritos no Sistema Nacional de Cadastro Ambiental (Sicar). Ou seja, a base cadastral está “povoada”, o que representa, sem dúvida, um grande avanço por parte dos governos, que criaram a tecnologia e infraestrutura para CAR, e dos proprietários rurais técnicos que aderiram à ferramenta. Esses cadastros ainda precisam, no entanto, ser analisados. Aqueles que têm passivos ambientais devem executar os projetos de adequação ambien-tal, com prazos definidos. Os que têm ativos devem ser recompen-sados. E todos precisam ser in-centivados e monitorados, para que a lei seja cumprida.

Mesmo onde as experiências do CAR foram bem-sucedidas e pioneiras, o desafio permanece. É o caso de Paragominas, no interior do Pará, que, no ano de 2009, antes da edição do novo Código Florestal e do CAR se tornar uma ferramenta nacional, já havia alcançado mais de 80% do seu território cadastrado. Hoje, a cidade possui 97,27% da área cadastra-da, um dos maiores índices no Pará, mas a validação ainda está na marca dos 33,56%, segundo dados da Secretaria Municipal de Meio Ambiente. Isso mostra o quanto ainda é preciso avançar.

A proximidade da COP 30 apresenta ao Brasil a oportunidade de lançar um vigoroso programa de implementação da sua principal lei florestal, projetando-se, de fato — e não apenas no sonho ou no discurso como uma potência ambiental. É preciso uma iniciativa que mobilize a sociedade brasileira e engaje os principais atores da agenda florestal, desde governantes a produtores, pesquisadores ou ambientalistas, com o objetivo comum de resgatar, consolidar e valorizar nosso patrimônio florestal. Faltam ações concretas e inovadoras de apostas na economia verde. E o ponto de partida para isso passa pelo avanço na análise e validação do CAR.

Por Adnan Demachki; Advogado Especializado em Desenvolvimento Econômico Sustentável, Consultor em Políticas Públicas, Ex-Prefeito de Paragominas por dois mandatos consecutivos

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