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Delegado de Polícia se pronuncia quanto a incidente ocorrido no CRRP

(Arquivo Célia Santos)

Em texto publicado em um grupo de Delegados e posteriormente replicado em outros grupos de uma rede social, o Delegado Marcellino Amazonas se pronunciou sobre incidente ocorrido no Centro de Recuperação Regional de Paragominas (CRRP).

‘Estimados(as) colegas Delegados(as),
Por uma questão de compartilhamento de experiências e informações que sejam de interesse geral da nossa categoria, presto os seguintes esclarecimentos:
Estou lotado na 13ª Seccional de Paragominas. Ontem, dia 17/08/2018, por volta das 10:00 recebemos na depol o Promotor de Justiça Dr. Carlos Lamarck, o qual solicitou que a Polícia Civil o acompanhasse até o presídio local – CRRP, pois havia notícia de baleamento de presos com elastômero (bala de borracha), o que, segundo o promotor, caracterizava tortura, pois a notícia que tinha e apresentava é que a “violência” teria ocorrido gratuita e covardemente. O promotor nos informou que havia a real possibilidade de ser dada voz de prisão em flagrante ao diretor do presídio, pois seria o responsável pela noticiada “tortura”. Ainda na depol relatei ao promotor que conhecia o diretor do presídio, Coronel Puty, que havia sido inclusive meu professor na acadepol ministrando a disciplina Direitos Humanos, que achava estranha a notícia, a princípio incompatível com a postura do professor Puty. Informei que os fatos seriam apurados com a cautela necessária que o caso requeria. Por determinação do diretor da seccional, como eu estava no plantão, fui designado para acompanhar a diligência requerida pelo Ministério Público. Assim o fiz, acompanhei o Promotor, fomos juntos na VTR (viatura). Talvez no intento de orientar, talvez no intento de determinar, o Promotor repetiu diversas vezes que se houvesse presos atingidos por balas de borracha eu deveria lavrar o flagrante. Argumentei que isso não era suficiente para a lavratura do flagrante, que a intervenção policial do GTO que ocasionou os disparos com a arma não letal (elastômero) havia ocorrido há dois dias, e que talvez tenha sido necessária para conter eventual motim dos presos, pois sabemos que eles ficam alterados com frequência, especialmente porque haviam sido transferidos para uma nova unidade prisional inaugurada efetivamente no dia 15/08/2018. O promotor, no que pese nunca antes ter requisitado a essa autoridade policial a lavratura de flagrante, naquele momento insistia que o caso era de tortura, e que se houvesse baleados por elastômero eu deveria lavrar o flagrante.
Chegando ao CRRP (presídio) fomos recebidos pelo Diretor daquela unidade, Cel Puty. O promotor anunciou que queria ver todos os presos, especialmente os baleados por elastômero. Já no interior das reclusas buscou-se identificar os internos que haviam eventualmente sido atingidos por elastômero. Assim que identificado o primeiro interno com pequeno hematoma na perna o promotor voltou a “orientar” que eu procedesse á prisão em flagrante do diretor do presídio. E assim se repetiu a cada interno que afirmava ter sido lesionado. Em todos os momentos eu dizia que não era suficiente ouvir o preso e decidir pelo flagrante do diretor do presídio, que era preciso ouvir a todos, enfermeiros, agentes prisionais, diretor, etc e só após todas as oitivas chegar-se à conclusão se havia crime ou não e se havia flagrante ou não. O promotor chegou a afirmar: “se a polícia civil negligenciar eu vou proceder contra a polícia civil”. Sempre que eu dizia que era prudente que os fatos fossem apurados através de inquérito por portaria o promotor rebatia, dizendo que era caso de flagrante, que eu devia fazer o flagrante, que o diretor do presídio iria fugir, etc. Não houve uma ordem expressa do tipo: “ prenda, é uma ordem”. Mas houve de forma bastante explícita a “determinação” reiterada diversas vezes para que eu prendesse em flagrante o diretor do presídio. Assumo aos colegas que fui e me senti bastante pressionado, mas não concordei com a lavratura do flagrante em nenhum momento. Depois de um tempo o promotor passou a dizer que até poderia entender meu posicionamento que não cabia o flagrante pelo baleamento com elastrômero, mas que era evidente o flagrante por ausência de cuidados médicos dos “lesionados”. Ocorre que um dos internos estava com curativo feito na enfermaria do CRRP, assim não era evidente a ausência de prestação de cuidados de saúde. Enfim, entendimentos diferentes entre os operadores do direito é absolutamente comum, haja vista não tratar-se de ciência exata mas sim sujeita à interpretação de cada operador. Quantas vezes não discordamos do posicionamento de um colega Delegado, de um Promotor ou de um Juiz¿ Mas precisamos respeitar os diferentes posicionamentos, sem fazer nem tentar fazer imperar o nosso entendimento. Ninguém tem o monopólio da verdade. O Promotor Dr. Lamarck é um bom promotor, engajado, garantidor de direitos e inclusive defende a nossa categoria de Delegados de Polícia no que tange por exemplo à carga horária de trabalho. Inclusive moramos no mesmo prédio. Infelizmente nesse episódio isolado acredito que houve uma atuação sua equivocada no que tange à extensão da orientação que o Promotor pode dar a um Delegado de Polícia, haja vista que pode legalmente requisitar a instauração de Inquérito (o que segundo a doutrina tem caráter de ordem), mas não pode requisitar a lavratura de Auto de Prisão em Flagrante.
Informo ainda que não houve animosidade em razão das divergências de interpretação e da “orientação” mais incisiva por parte do Promotor. Houve sim um certo constrangimento, mas que efetivamente está sendo sanado por nós com o apoio de todos vocês.
Obrigado

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