Em artigo divulgado no Journal of Experimental Medicine, grupo do Centro de Pesquisa em Doen\u00e7as Inflamat\u00f3rias da USP revela que enzima relacionada \u00e0 produ\u00e7\u00e3o de energia celular tamb\u00e9m participa da diferencia\u00e7\u00e3o de c\u00e9lulas autoimunes envolvidas na inflama\u00e7\u00e3o exacerbada. Descoberta pode levar a tratamentos mais eficazes (imagem: acervo do pesquisador)<\/figcaption><\/figure>\nMaria Fernanda Ziegler | Ag\u00eancia FAPESP \u2013 Pesquisadores do Centro de Pesquisa em Doen\u00e7as Inflamat\u00f3rias (CRID) da Universidade de S\u00e3o Paulo (USP) descobriram que uma enzima ligada a processos metab\u00f3licos tamb\u00e9m est\u00e1 envolvida na diferencia\u00e7\u00e3o de c\u00e9lulas imunes e, por consequ\u00eancia, no desenvolvimento de doen\u00e7as autoimunes. O achado pode, no futuro, direcionar novos tratamentos e medicamentos mais efetivos e com melhor custo-benef\u00edcio para esse tipo de doen\u00e7a.<\/p>\n
Em artigo publicado no Journal of Experimental Medicine, pesquisadores descrevem o papel da enzima PKM2 (pytuvate kinase M2) \u2013 comumente envolvida na produ\u00e7\u00e3o de energia celular (glic\u00f3lise) \u2013 no desenvolvimento e na manuten\u00e7\u00e3o da inflama\u00e7\u00e3o exacerbada associada \u00e0s doen\u00e7as autoimunes.<\/p>\n
\u201cNo estudo demonstramos que h\u00e1 uma conex\u00e3o entre metabolismo celular e sistema imune. Est\u00e1 ficando muito claro que enzimas e outras mol\u00e9culas metab\u00f3licas s\u00e3o importantes n\u00e3o apenas para o metabolismo celular, mas tamb\u00e9m para outras fun\u00e7\u00f5es, como a resposta imune. Nesse caso espec\u00edfico, verificamos que a enzima PKM2 atua paralelamente na diferencia\u00e7\u00e3o do linf\u00f3cito Th17. Esse subtipo de linf\u00f3cito desencadeia a encefalomielite autoimune experimental, um modelo animal de esclerose m\u00faltipla\u201d, explica Jos\u00e9 Carlos Farias Alves Filho, pesquisador do CRID, um Centro de Pesquisa, Inova\u00e7\u00e3o e Difus\u00e3o (CEPID) apoiado pela FAPESP na Faculdade de Medicina de Ribeir\u00e3o Preto (FMRP-USP).<\/p>\n
O estudo foi conduzido durante o mestrado de Luis Eduardo Alves Damasceno, bolsista da FAPESP e orientando de Alves Filho.<\/p>\n
A jornada do linf\u00f3cito T<\/p>\n
Com o objetivo de neutralizar especificamente diferentes tipos de pat\u00f3genos, as c\u00e9lulas imunes conhecidas como linf\u00f3citos T se diferenciam em uma variedade de subtipos, como, por exemplo, nas c\u00e9lulas T auxiliares ou \u201chelpers\u201d 17 (Th17). Esse subtipo, no entanto, est\u00e1 associado ao desenvolvimento e\u00a0manuten\u00e7\u00e3o da inflama\u00e7\u00e3o comum a doen\u00e7as autoimunes.<\/p>\n
Por motivos ainda n\u00e3o totalmente compreendidos, nas doen\u00e7as autoimunes como a esclerose m\u00faltipla, artrite e psor\u00edase\u00a0a resposta imune pode ocorrer de forma descontrolada, levando os linf\u00f3citos a reconhecer o pr\u00f3prio organismo como pat\u00f3geno, passando a atac\u00e1-lo.<\/p>\n
Damasceno desenvolveu seu projeto em modelos de encefalomielite autoimune experimental, uma condi\u00e7\u00e3o autoimune, inflamat\u00f3ria e desmielinizante do sistema nervoso central. A condi\u00e7\u00e3o causa a perda da bainha de mielina que recobre os neur\u00f4nios e \u00e9 importante para a transmiss\u00e3o de impulsos nervosos. Esse modelo experimental guarda semelhan\u00e7as com o quadro observado em pacientes com esclerose m\u00faltipla.<\/p>\n
J\u00e1 \u00e9 sabido que o linf\u00f3cito Th17 tem papel importante na media\u00e7\u00e3o tanto do desenvolvimento da doen\u00e7a autoimune quanto na progress\u00e3o da neuroinflama\u00e7\u00e3o caracter\u00edstica de algumas doen\u00e7as desse tipo. Ao atuar na resposta autorreativa inicial da doen\u00e7a, o linf\u00f3cito Th17 passa a identificar ant\u00edgenos presentes no sistema nervoso central como uma amea\u00e7a, liberando ent\u00e3o grandes quantidades de uma prote\u00edna com a\u00e7\u00e3o pr\u00f3-inflamat\u00f3ria chamada interleucina 17 (IL7), tanto no fluido c\u00e9rebro espinhal quanto em les\u00f5es ativas no tecido cerebral.<\/p>\n
No estudo realizado em cultura celular e modelo animal, os pesquisadores do CRID observaram que a diferencia\u00e7\u00e3o celular para o Th17, assim como o desenvolvimento da doen\u00e7a, depende da reprograma\u00e7\u00e3o metab\u00f3lica, induzindo inclusive mudan\u00e7as para a glic\u00f3lise. \u201cA enzima glicol\u00edtica piruvato quinase M2 (PKM2) se mostrou um fator-chave que medeia a diferencia\u00e7\u00e3o celular Th17 e a inflama\u00e7\u00e3o autoimune. No estudo, demonstramos que ela \u00e9 muito expressa durante a diferencia\u00e7\u00e3o do linf\u00f3cito T para as\u00a0c\u00e9lulas Th17\u201d, diz\u00a0Alves Filho.<\/p>\n
Nos testes in vitro, ao excluir a PKM2 espec\u00edfica para c\u00e9lulas T houve preju\u00edzo na diferencia\u00e7\u00e3o celular Th17 e os sintomas da doen\u00e7a foram amenizados, diminuindo a inflama\u00e7\u00e3o e a desmieliniza\u00e7\u00e3o mediadas pelo Th17. \u201cJ\u00e1 nos testes realizados em camundongos que n\u00e3o expressam essa enzima, conseguimos reduzir o desenvolvimento da doen\u00e7a em mais de 50%. Tamb\u00e9m fizemos o estudo com drogas comerciais que inibem a PKM2\u201d, afirma\u00a0Alves Filho.<\/p>\n
Os pesquisadores analisaram ainda o uso de drogas comerciais que inibem a enzima PKM2. \u201cUtilizamos uma droga capaz de inibir a transloca\u00e7\u00e3o nuclear da PKM2, fazendo com que a enzima n\u00e3o chegue at\u00e9 o n\u00facleo celular. Portanto, mesmo que o linf\u00f3cito expresse a enzima, ela n\u00e3o atua nesse processo de desenvolvimento da doen\u00e7a. Ocorre diminui\u00e7\u00e3o da diferencia\u00e7\u00e3o de linf\u00f3citos Th17, o que reduz sua evolu\u00e7\u00e3o\u201d, diz.<\/p>\n
Custo-benef\u00edcio no tratamento<\/p>\n
Alves Filho ressalta que a descoberta do papel-chave da enzima PKM2 no desenvolvimento de doen\u00e7as autoimunes abre caminho para o estabelecimento\u00a0de novas estrat\u00e9gias de tratamento.<\/p>\n
Atualmente, existem no mercado diferentes f\u00e1rmacos imunobiol\u00f3gicos para o tratamento de doen\u00e7as autoimunes, que atuam inibindo citocinas envolvidas na ativa\u00e7\u00e3o e diferencia\u00e7\u00e3o desses diferentes subtipos de linf\u00f3citos.<\/p>\n
\u201cEstima-se, por\u00e9m, que cerca de 40% dos pacientes por algum motivo n\u00e3o respondem bem a esse tratamento. Para essa parcela da popula\u00e7\u00e3o existe outro tipo de tratamento com os medicamentos imunobiol\u00f3gicos, que t\u00eam um benef\u00edcio muito grande, mas s\u00e3o extremamente caros e, portanto, n\u00e3o conseguem atingir toda a popula\u00e7\u00e3o\u201d, acrescenta.<\/p>\n
A enzima faz parte da plataforma de pesquisas de desenvolvimento de drogas do CRID. \u201cNo estudo, utilizamos uma droga comercial que atua em um s\u00edtio alost\u00e9rico da enzima PKM2, bloqueando sua capacidade de se translocar para o n\u00facleo do linf\u00f3cito\u201d, relata.<\/p>\n
Dessa forma, os pesquisadores do CRID iniciaram um novo estudo, em colabora\u00e7\u00e3o com o Laborat\u00f3rio Nacional de Bioci\u00eancias do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (LNBio-CNPEM), com o intuito de desenvolver novas drogas que atuem na transloca\u00e7\u00e3o da enzima. \u201cIsso abre uma perspectiva futura de tratamento para doen\u00e7as autoimunes, ou para doen\u00e7as inflamat\u00f3rias que dependam dessa enzima. Nessa pr\u00f3xima etapa, estamos buscando o desenvolvimento de novas drogas que possam interagir com esse sitio de intera\u00e7\u00e3o e que inibam a capacidade da enzima de translocar para o n\u00facleo.\u201d<\/p>\n
O artigo PKM2 promotes Th17 cell differentiation and autoimmune inflammation by fine-tuning STAT3 activation\u00a0pode ser lido em: https:\/\/rupress.org\/jem\/article\/217\/10\/e20190613\/151965\/PKM2-promotes-Th17-cell-differentiation-and.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"
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