STF acata absolvi\u00e7\u00e3o por ‘leg\u00edtima defesa da honra’ em caso de feminic\u00eddio –\u00a0Pixabay<\/figcaption><\/figure>\nA 1\u00aa Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) manteve nesta ter\u00e7a-feira (29) a absolvi\u00e7\u00e3o de um homem que tentou matar a ex-mulher a facadas diante de suspeitas de trai\u00e7\u00e3o conjugal por parte da companheira. No j\u00fari ocorrido em 2017, a defesa sustentou que o ataque estava amparado na “leg\u00edtima defesa da honra”, argumento que ganhou apoio un\u00e2nime dos jurados na oportunidade. Os ministros do STF entenderam que a decis\u00e3o pelo tribunal do j\u00fari \u00e9 soberana e n\u00e3o pode ser modificada.<\/p>\n
A vota\u00e7\u00e3o terminou 3 a 2 a favor da manuten\u00e7\u00e3o da absolvi\u00e7\u00e3o, com votos a favor do relator Marco Aur\u00e9lio Mello e dos ministros Dias Toffoli e Rosa Weber. Votaram contra os ministros Alexandre de Moraes e Lu\u00eds Roberto Barroso. O Tribunal de Justi\u00e7a de Minas Gerais e o Superior Tribunal de Justi\u00e7a (STJ) tinham entendido que a absolvi\u00e7\u00e3o contrariava as provas reunidas no processo e deliberaram pela realiza\u00e7\u00e3o de um novo j\u00fari, o que agora, com a decis\u00e3o do STF, n\u00e3o dever\u00e1 ocorrer.<\/p>\n
No Brasil, crimes intencionais contra a vida, como assassinatos e tentativas de assassinato, s\u00e3o julgados por um corpo de jurados formado por cidad\u00e3os comuns. Eles ouvem os argumentos formulados pela acusa\u00e7\u00e3o e pela defesa e votam para decidir pela absolvi\u00e7\u00e3o ou condena\u00e7\u00e3o dos r\u00e9us. Essa decis\u00e3o \u00e9 considerada soberana, ou seja, n\u00e3o pode ser modificada, o que vem sendo ratificado pelo STF nos \u00faltimos anos.<\/p>\n
Em 2017, um tribunal do j\u00fari foi formado em uma cidade pr\u00f3xima de Belo Horizonte, para julgar o homem que, em maio de 2016, atacou a facadas a ex-companheira de quem havia se separado na semana anterior.<\/p>\n
Ele fugiu ap\u00f3s o ataque, mas foi preso em seguida. \u00c0 pol\u00edcia e \u00e0 Justi\u00e7a, confessou a agress\u00e3o sob a justificativa de que desconfiava que a mulher estaria tendo um caso com um outro homem. “Bateu um trem doido” foi como ele descreveu o momento, relatando que “foi pegando na sua cabe\u00e7a” a desconfian\u00e7a contra a v\u00edtima at\u00e9 o dia em que a atacou nas imedia\u00e7\u00f5es de uma igreja, desferindo golpes com uma faca de serra que feriu a mulher nas costas e na cabe\u00e7a. “Desferi tr\u00eas facadas na minha ex, pois vi v\u00e1rias conversas amorosas no celular dela, sou trabalhador e n\u00e3o posso aceitar de forma alguma uma situa\u00e7\u00e3o humilhante dessas”, disse ao policial que o prendeu ap\u00f3s as agress\u00f5es, segundo consta do depoimento do agente \u00e0 Justi\u00e7a. O agressor permaneceu detido at\u00e9 o julgamento.<\/p>\n
No julgamento, sua defesa apostou no argumento da “leg\u00edtima defesa da honra”. “Ela era a mulher dele e estava fazendo sacanagem com ele. N\u00e3o tinha necessidade de fazer isso. Mas fez, o que \u00e9 que vai fazer? Mas ela fez um curativo no hospital e foi embora para casa. \u00c9 uma hist\u00f3ria entre marido e mulher”, disse ontem ao Estad\u00e3o o advogado Jos\u00e9 Ramos Guedes, que atuou no j\u00fari. “Aleguei leg\u00edtima defesa da honra. O sujeito confia na pessoa e ela sai para fazer uma coisa… Ele ficou aborrecido, se sentiu desonrado”, completou o advogado.<\/p>\n
O argumento sustentado por Guedes ganhou apoio un\u00e2nime entre os jurados. O r\u00e9u foi absolvido e solto ap\u00f3s o julgamento. O Minist\u00e9rio P\u00fablico apresentou recurso ao TJ de Minas, pedindo a anula\u00e7\u00e3o do j\u00fari, no que foi atendido. A Corte mineira cassou a decis\u00e3o dos jurados e determinou novo julgamento, decis\u00e3o mantida pelo STJ.<\/p>\n
Supremo<\/strong><\/p>\nPara defender o seu voto a favor da manuten\u00e7\u00e3o da absolvi\u00e7\u00e3o do r\u00e9u, o relator Marco Aur\u00e9lio Mello, do STF, argumentou com base na Constitui\u00e7\u00e3o Federal. “Temos que a lei maior assegura a soberania dos veredictos. O que \u00e9 julgamento pelo Tribunal do J\u00fari? \u00c9 o julgamento por iguais, \u00e9 o julgamento por leigos, a partir dessa previs\u00e3o constitucional”, disse.<\/p>\n
O ministro Dias Toffoli seguiu a mesma linha, refor\u00e7ando que o j\u00fari tem soberania em seus veredictos tanto para condena\u00e7\u00e3o quanto para absolvi\u00e7\u00e3o. “O Tribunal do J\u00fari \u00e9 uma institui\u00e7\u00e3o anacr\u00f4nica, temos uma epidemia de homic\u00eddios no Brasil, a viol\u00eancia \u00e0 mulher \u00e9 uma parte dessa epidemia, uma das mais graves, n\u00e3o s\u00f3 a mulher, \u00e0s crian\u00e7as, aos adolescentes, aos homossexuais, sabemos disso e o Tribunal tem dado respostas muito enf\u00e1ticas a respeito disso. Como juiz, como magistrado, n\u00e3o posso fugir aquilo que est\u00e1 na constitui\u00e7\u00e3o, artigo 5.\u00ba, inciso 38.”<\/p>\nA ministra Rosa Weber tamb\u00e9m ressaltou que o caso \u00e9 muito “delicado”, mas que decidiria o seu voto entendendo que “h\u00e1 preval\u00eancia da norma constitucional”.<\/p>\nOs votos contr\u00e1rios discutiram a possibilidade de anula\u00e7\u00e3o do j\u00fari, assim como o peso do argumento de leg\u00edtima defesa da honra h\u00e1 muito contestado por especialistas.<\/p>\n
Para o ministro Alexandre de Moraes, que votou contra a manuten\u00e7\u00e3o da absolvi\u00e7\u00e3o, \u00e9 constitucionalmente poss\u00edvel a realiza\u00e7\u00e3o de um novo julgamento pelo pr\u00f3prio Tribunal do J\u00fari e n\u00e3o se deve tornar o corpo de jurados em um poder “incontrast\u00e1vel, ilimitado, sem qualquer possibilidade de revis\u00e3o”.<\/p>\n
O ministro Barroso, por sua vez, votou destacando que n\u00e3o gostaria de viver num pa\u00eds em que os homens pudessem matar as mulheres por ci\u00fames e sa\u00edrem impunes. “Se chancelarmos a absolvi\u00e7\u00e3o de um feminic\u00eddio grave como esse pode parece que estamos passando a mensagem de que um homem, ao se sentir tra\u00eddo pode esfaquear a sua mulher, tentando mat\u00e1-la em leg\u00edtima defesa da honra ou seja l\u00e1 em que tese se possa definir. N\u00e3o parece que no s\u00e9culo 21 essa seja uma tese que possa se sustentar”, argumentou, mas acabou vencido.<\/p>\n
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